20.11.05

Subcontratados, explorados, irregulares e roubados (a triste sorte dos trabalhadores portugueses em Espanha)


O despertador toca às 5 da manhã de 2ª feira na casa de António Fernandes da Silva, operário de construção civil, na cidade do Porto. Os seus 53 anos e a crise económica portuguesa obrigaram-no a colocar-se sob a direcção de uma empresa subcontratada para a construção de um grande centro comercial em Vigo, para onde se dirige numa carrinha da empresa, com os seus companheiros de trabalho, em cada 2ª feira. Esperam-no duas de viagem , outras 11 de jornada laboral, cinco dias de convívio com outros operários portugueses num pequeno apartamento da cidade galega e um salário que não chega aos 1.500 euros.
António, porém, não se queixa. É que, depois de uma camada de cimento que o endurece, mais o seu farto bigode, lembra-se dos seus colegas que continuam a trabalhar em Portugal com metade do dinheiro que actualmente ganha. E também não se importa muito que os trabalhadores espanhóis a trabalhar na mesma obra ganhem quase o dobro que ele, quando desabafa: « Em Portugal há muito pouco emprego e dinheiro. Lá muitos operários não ganham mais que o salário mínimo, de 374,70 euros, enquanto aqui ganha-se o mínimo».
António é só um entre dezenas de portugueses que trabalham na obra que se está a construir nas margens da Gran Via da cidade de Vigo e em cuja empreitada participam 9 empresas subcontratadas portuguesas. Dos quase 50.000 trabalhadores portugueses inscritos na Segurança Social espanhol, segundo o Ministério do trabalho português, a grande maioria trabalha em empresas subcontratadas no sector da construção civil. No passado mês de Julho estavam registados 48.463 emigrantes regulares, quase 10% a mais que no anterior mês de Abril, apesar de tudo indicar que esse número seja muito maior se contarmos os irregulares.
Na Galiza, por exemplo, os trabalhadores registados não ultrapassam os 5.000, mas segundo Javier Dongil, secretário da Acción Sindical das CCOO da região, podem na realidade alcançar os 30.000, incluindo os trabalhadores temporários, que cruzam diariamente a fronteira para trabalhar em Espanha e que regressam à noite para as suas casas.
Os sindicatos lusos calculam que haja cerca de 12.000 portugueses trabalhando de forma clandestina sem contrato nem segurança social no território do Estado espanhol. «É quase impossível quantificar, mas existem zonas inteiras de Portugal em a maioria da população masculina cruza a fronteira para trabalhar», diz-nos Albano Ribeiro, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil e Obras públicas do Norte. E, caso não se faça nada, esse número irá aumentar, ao esclarecer: «Nos próximos meses de Janeiro e Fevereiro vão ficar no desemprego outros 6.000 operários portugueses.»
Exploração, abusos, comissões, subcontratados, piores salários, trabalhos mais perigosos, jornadas laborais intermináveis…Tudo isto aparece frequentemente nos media portugueses quando se referem à emigração lusa para Espanha. E que veio à luz do dia com muito mais desde o acidente de Almuñécar ( Granada) no passado dia 7.
«Não é nenhuma casualidade que, dos seis mortos, cinco eram portugueses», diz Ribeiro que, depois de um périplo por Espanha, para visitar centenas de obras onde trabalham operários portugueses, denunciou a situação generalizada de irregularidades, de precariedade, de subcontratação irregular, fraude, evasão, sinistralidade e morto que caracteriza o sector da construção civil espanhol.
Ribeiro explica como funciona esse submundo em que vivem «pelo menos 60% dos 20.000 operários temporários» que trabalham desde há dois anos em Espanha, por causa da crise portuguesa: « As máfias de engajadores (comissionistas) contratam-nos aqui como se fossem trabalhar em Portugal, mas anunciando salários mais atraentes. Cada engajador tem centenas de trabalhadores a seu cargo e ficam com cerca de 35% do salário, com o pretexto de pagar custos de deslocação e manutenção. Eles próprios encarregam-se de cobrar junto das empresas espanholas, que pagam salários próximos aos trabalhadores espanhóis, distribuindo aos trabalhadores português o montante acordado depois de terem descontado para si próprios aquela percentagem.». Feito o descontos, os trabalhadores acabam por receber apenas pouco mais que o salário sectorial que é habitualmente pago em Portugal, e que é de 496 euros.«Um trabalhador espanhol que esteja a trabalhar nos andaimes durante 8 horas ao longo de cinco dias ganha 1.400 euros. Os português, em contrapartida, têm que trabalhar 12 horas diárias, incluindo Sábado, para ganhar o mesmo.». Muitos trabalham de sol a sol, fazendo tarefas para as quais nem sempre estão capacitados.
Estas redes mafiosas «não têm nem sede nem escritórios, nem registo legal, nem valor imobilizado, nem muito menos apresentam qualquer declaração ao Fisco». Segundo o Sindicato, conseguem ganhar fortunas em muito pouco tempo e operam entre Espanha, França e Portugal. «Quando têm problemas com alguém transferem os operários para outro país», adianta. Apesar de serem fantasmas, estes engajadores seriam fáceis de detectar, nas palavras de Albano Ribeiro .
O dirigente sindicalista crê que tudo isso é um reflexo da ilegalidade em que vive o sector da construção civil português: «Das 20.000 empresas de construção a metade não cumpre com as suas obrigações fiscais.»
Recorde-se que a actividade de intermediação laboral está proibida por lei que obriga as empresas que deslocam mão de obra a comunicar a chegada de trabalhadores às autoridades laborais da região onde aqueles vão trabalhar, obrigando ao respeito pelas tabelas salariais, normas de segurança e horários de trabalho vigentes.
O problema é que as inspecções de trabalho não podem comprovar nada disso, se o empregador não tiver comunicado que tem trabalhadores a seu cargo em determinada obra !!!


A nova emigração portuguesa

Portugal é, no momento actual, um dos grandes fornecedores de mão de obra barata para as empresas espanholas, tal como acontecia nos anos 60 com Portugal e Espanha relativamente aos países como França e Alemanha.
Ainda hoje vivem em França cerca de 788.603 portugueses, e 200.000 na Inglaterra.
A emigração portuguesa não se limita já ao sector agrícola ou de construção. Segundo dados recentes, 20% dos licenciados portugueses trabalham fora do país. E os números globais ainda são mais impressionantes: existem cerca de 4,8 milhões de portugueses ou descendentes ( note-se que Portugal tem 10 milhões de habitantes) repartidos pelos cinco continentes: 1.386.292 pessoas na Europa; 2.993.127 na América; cerca de 300.000 em África; 30.000 na Ásia e mais de 55.000 na Oceânia.
A crise económica e as profundas desigualdades estão na origem da nova vaga de emigração portuguesa para o estrangeiro, com destino desta vez para território espanhol. Uma emigração que vai encontrar trabalhos precários, perigosos e normalmente subcontratados.

Tradução de grande parte de um texto originalmente publicado no jornal El País de 10 de Novembro de 2005 de autoria de Pablo Campos e Miguel Mora.

O preço do «progresso» da China é a sobre-exploração dos trabalhadores


A china regista presentemente um saldo positivo no seu comércio externo que não pára de aumentar. Este ano crescerá 50 % relativamente ao ano passado ( 2004) atingindo o valor de 48.000 milhões de dólares.
Mas há dados que importa divulgar, até para servirem de reflexão para uso caseiro. Na verdade, 50% das exportações chinesas procedem de empresas com capital estrangeiro, ou seja, são empresas resultantes de investimento estrangeiro ou muito simplesmente de empresas deslocalizadas de outros países que procuram a China para se instalarem por causa da inexistência e desrespeito pelos direitos laborais que caracteriza o capitalismo chinês.
Jornadas de trabalho com duração de 15 horas, semana de 7 dias de trabalho, baixo salários, obrigação de horas extra, remunerações em falta ou muito simplesmente não pagas, condições insalubres de trabalho, proibição de conversas, videovigilância, alojamento em dormitórios construídos nas instalações da própria empresa, retenção de documentos pessoais e limitação na circulação dos trabalhadores são realidades vulgares na China actual, especialmente entre os 140 milhões de emigrantes que deixaram as zonas rurais para virem trabalhar nas orlas industriais do litoral. Sem esquecer, evidentemente, a terminante proibição imposta pelo governo e Estado chinês na constituição de sindicatos independentes.
Li Qiang, que está à frente da «China Labour Wath», afirma: «A China está apostada numa política de crescimento económico independentemente dos custos humanos. Tem uma abundante oferta de mão de obra, cujos salários baixos são artificialmente mantidos e, num sistema em que as vidas são tão baratas, não surpreende que os lucros sejam elevados»

Os motins nos subúrbios nas últimas décadas


Breve lista dos últimos motins nos subúrbios das cidades industrializadas:

- Watts, subúrbios de Los Angeles, em 1965, durante o período de expansionismo económico norte-americano. A causa imediata foi a morte de um negro de 21 anos e que originou 10 dias de tumultos com 34 mortes.

-Soweto, Àfrica do Sul, em 1976, em pleno período de apartheid sul-africano. A causa imediata foi a decisão governamental de obrigar os jovens negros a estudar o afrikaan, a língua da minoria branca. Nos tumultos desencadeados a polícia mata uma criança de 13 anos e morrem 23 pessoas.

-Brixton, Grã-Bretanha, em 1981, durante o governo de Thatcher, por motivo da política governamental contra as minorias antilhesa e indiana que reivindicavam sair da situação de pobreza em que viviam. Durante os tumultos morreram 9 pessoas e outras 50 ficaram feridas.

-South Central, um bairro pobre de Los Angeles, em 1992, por motivo de um espancamento de polícias a um motorista negro, filmado por um vídeo amador que provocou um revolta generalizada ao grito «Não pode haver pez sem justiça» e de que resultará em 55 mortos e 2.000 feridos.

-Subúrbios de Paris, Novembro de 2005

Madalena:desfeito o último tabu do cristianismo


Um livro saído recentemente de Juan Árias, «La Magdalena, el último tabu del cristianismo» ataca um dos pilares do cristianismo, o poder masculino. E fá-lo tratando de uma figura feminina, Madalena.
A imagem tradicional de Madalena que a Igreja Católica difundiu ao longo de séculos era que se tratava de uma mulher pecadora pública ( leia-se, prostituta) e que se convertera quando conheceu o fundador do cristianismo, enquanto este comia na casa de um fariseu. Durante séculos, a hierarquia eclesial não hesitou em manipular esta figura a seu bel prazer de forma a transmitir uma imagem arquetípica de mulher segundo as conveniências da Igreja Católica.
Ora o que Juan Árias nos apresenta é antes uma apaixonada história de amor entre Jesus e Madalena que levou, inclusivamente, os apóstolos a se escandalizarem e ocultarem uma tal relação. Jesus era, afinal, casado com Madalena – o que é hoje aceite como consensual - e que explica, aliás, o facto de quando se produz a ressurreição Jesus preferir comunicá-la a Madalena do que à sua própria mãe. Nota ainda o autor que os evangelistas nunca em momento algum apresentam a figura de Jesus como exemplo de celibato.Madalena foi realmente uma peça importantíssima nos primeiros tempos do cristianismo e o conhecimento que começamos ter dela constituirá sem dúvida uma verdadeira revolução no machismo eclesiástico da Igreja Católica