6.6.05

O currículo oculto dos manuais escolares



Os manuais escolares constituem apenas uma parte do que se aprende nas escolas – uma vez que nelas também se aprendem coisas tão impregnantes como a obediência, a imobilidade, a forma competitiva de nos relacionarmos com os outros, quantas vezes sob a capa da cooperação etc – mas a verdade é que são uma boa ( e amarga ) amostra das categorias e dos esquemas mentais que se pretende socializar junto das gerações mais novas, esquemas e atitudes essas que vão estar, mais tarde, na origem das opiniões e da visão do mundo dos actuais jovens.


Apesar dos manuais serem apenas uma fonte, entre outras, de formação escolar e educativa, eles são bem representativos do que o Estado, e com ele, as ideias dominantes numa dada sociedade, pretende difundir e impor aos alunos. Para agravar mais as coisas, não é raro encontrarmos pessoas para as quais o conteúdo dos manuais escolares assume um carácter de verdade absoluta e inquestionável !!!
Encontramos, desde logo, em muitos senão mesmo todos manuais um rasgado e incondicional elogio à tecnologia, e pouca e mesmo nenhuma referência aos seus aspectos negativos. Pretende-se passar a ideia que será a tecnologia a resolver os problemas presentes e nunca se enfatiza a necessidade de transformação das estruturas sociais e dos convencionalismos dominantes.
Muitos grupos sociais tornam-se completamente invisíveis a quem leia a maior parte dos manuais escolares portugueses. Desde os homossexuais até às mulheres domésticas, passando pela terceira idade e pelos operários, muitos grupos sociais e profissionais são suprimidos ou é o mesmo que não existissem à face da terra, tudo isso numa estratégia discursiva que visa consagrar os grupos e elementos que sejam importantes para o mercado, os com papel activo segundo a retórica dominante.
Ignoram-se e desprezam-se igualmente as culturas e práticas locais que, como não se revestem de natureza depredatória, são encaradas as mais das vezes como …atrasadas.
A natureza, a terra e a vida mostram-se sempre como actividades subordinadas à economia e ao mercado. Prevalece uma lógica produtivista. A ecodependência das sociedades humanas é permanentemente uma ilustre desconhecida para os livros escolares, e passa-se ao lado da natureza insustentável dos actuais processos económico-sociais. Celebram-se, por exemplo, os transportes rápidos, e a longa distância, sublimando-se explícita e sub-repticiamente os valores ligados velocidade custe o que custar.
Pior ainda é o profundo e marcado etnocentrismo que todos ou quase todos os manuais dão mostras evidentes, qualquer que seja o nível escolar para que foram destinados.
A história é convertida numa história dos Estados e do poder, com mapas e fronteiras amiúde, relegando para um plano secundário as histórias das culturas e a dinâmica social.
Perpassa em todos esses livros uma noção linear da evolução que acaba por sublimar, invariavelmente, as virtudes da modernidade, esquecendo-se de referir o quanto de barbárie esta mesma modernidade tem engendrado.
As soluções políticas e individuais são sempre de natureza individualista. Parece que não há decisões estruturais a assumir. Fazem-se recomendações e conselhos para o indivíduos, mas não se denunciam as soluções tecnocráticas e lucrativas tomadas pelas autoridades para as sociedades capitalistas.
E passam em branco muitas das áreas fundamentais da nossa vida, desde a educação sexual até à realidade, muito bem escondida, do vil e rentável negócio de armas e do domínio do complexo militar-industrial., passando pela repressão e controle dos cidadãos, a exploração económica, as mentiras e a manipulação mediática, etc,etc.

No fundo, os manuais escolares não preparam nem para o presente, nem muito menos para o futuro. Ignoram ou fazem por ignorar as grandes linhas que movem o mundo e a civilização actual. Servem antes para legitimar um modo de vida adequado às realidades sociais do sistema económico dominante, mas insustentável a curto prazo.
Não falamos, obviamente, dos erros científicos e metodologias discutíveis que pululam nos vários livros de texto editados em concorrência por várias editoras a preços proibitivos, que custam os olhos da cara a muitas famílias. Tudo para bem da reprodução social do capitalismo depredatório.

Activismo e espiritualidade ( Starhawk)


«Muitos activistas desconfiam da religião e da espiritualidade, frequentemente por muitas e boas razões. Mas cada um de nós que estamos empenhados neste trabalho tem qualquer coisa de sagrado – no sentido em que, qualquer que seja isso, não significa conforto ou prazer, mas que determina todos os nossos outros valores, e em que estamos dispostos a assumir riscos para o servir. Não precisa de deus nem de deusas ou de divindade alguma, mas pode consistir muito simplesmente na crença na liberdade, no sentimento que experimentamos quando estamos debaixo de uma sequóia, ou quando observamos uma pássaro a atravessar o céu, ou ainda quando lutamos pela verdade e pelas crianças. O que quer que ela seja, essa coisa alimenta-nos e dá-nos força. Para aqueles activistas que se identificam com uma prática espiritual, é chegado o momento de a pôr em prática, a sério. Para todos os outros, talvez valha a pena de guardar um pouco mais de tempo para se perguntar: «porque faço eu isto? O que é que é mais importante para mim? O que é que me dá forças?»

A resposta poderá ser grande ou nobre, modesta ou banal, a música hip hop ou o grafitti. Pouco importa, mas fazei dela a vossa prioridade. Praticai-la todos os dias ou, pelo menos, regularmente. Trazei-a convosco durante as acções em que vos empenhais. Deixai-a reforçar a vossa energia quando estais desencorajado.

Temos necessidade de vós todos nesta luta prolongada. E cuidar-vos é certamente um meio de preservar um dos recursos mais preciosos do movimento.

Não há nada onde ir se lá ainda não estivermos. Se mantivermos esperança e visão. Se ousarmos marchar com coragem e agir ao serviço daquilo que amamos, as barreiras, que encontrarmos, cederão, como a polícia cedeu aquando da nossa marcha para Washington. O caminho não e balizado, nem cartografado. Isso transmite um sentimento de estranheza, mas trata-se de um sentimento vivificante, um sentimento de risco, mas também um sentimento de liberdade. Nascemos para trilhar essa caminho, e os grandes poderes da vida e da criatividade marcham connosco para um futuro viável»

Excerto de «Só a poesia», texto publicado no livro «Parcours d’une Altermondialiste» de Starhawk, na edição francesa de «Empêcheurs de penser en rond»

Nota: Starhawk é uma conhecida activista anti-globalização, feiticeira neo-pagã, autora de diversos textos e de livros que nos falam da resistência anticapitalista não-violenta e da prática espiritual.
Starhawk esteve recentemente em Paris onde debateu com os activistas e as feministas francesas as suas teses e as práticas que rotagonizou nos Estados Unidos, de onde é originária.

Mais info:
www.starhawk.org
http://paris.indymedia.org/article.php3?id_article=37090

Esperanto na Internet



Para aceder a múltiplos sites, a recursos vários, conversar e ler textos e livros, além de poder aprender e fazer um curso na língua internacionalista como o Esperanto pode ir a:

O Congresso dos Vagabundos ( Stuttgart, 1929)



No fim dos anos 20, número de desempregados e sem-abrigo não parava de crescer na Alemanha. Muitos jovens partiam pelas estradas na esperança de encontrar emprego e pão. No caminho encontravam operários, artesãos e vagabundos que se tratavam todos entre si como «companheiros». Os desempregados citadinos, entre os quais se encontravam elementos politizados e outros que se interessavam por arte, passaram a conviver com os vagabundos.
Aparece então em 1927 o primeiro número da revista dos vagabundos «Der Kunde» ( «O Companheiro»), editado pelo escritor Gregor Gog, que vivia numa cabana de madeira, construída por ele mesmo, nos arredores de Stuttgart. Tinha a intenção de fundar uma «Confraria dos Vagabundos» internacional a fim de superar a atomização e a passividade dos sem-pátria. Com esse objectivo é que Gregor Gog lança um convite aos vagabundos para um encontro internacional em Stuttgart para a semana do Pentecostes de 1929. Compareceram cerca de 300 pessoas que se reuniram entre 21 e 23 de Maio no jardim da juventude livre-pensadora, atrás da Escola das Artes Aplicadas situada em Killesberg, Stuttgart. As autoridades locais tudo fizeram para silenciar a iniciativa, mas a imprensa não deixou de fazer reportagens circunstanciadas e publicar fotografias. Gregor Gog abriu o «Congresso». Falaram, em seguida, o pintor Hans Hammelrath, o agitador comunista Rudolf Geist, o advogado Philip Heinz, o professor exilado Karl Roltsch e o pastor Jakob Weidemann. Seguramente que para os operários presentes os discursos pareceram muito longos e algo solenes. Apesar de não terem ultrapassado poucas centenas de participantes, o encontro foi um sucesso. A vagabundagem fazia parte dos sinais do tempo que passava, e a imprensa não hesitou em relatar o acontecimento. Tanto mais que não se via solução para a crise social, e as autoridades tradicionais iam sofrendo forte erosão, o que permitiu um certo efeito «mobilizador». Começavam, enfim, a organizar-se, aqueles que se tinham tornado nómadas. Discutiam ao longo do dia, entre si, e apresentavam orgulhosamente os primeiros documentos de uma cultura específica, «não sedentária». Simultaneamente, na Casa das Artes Hirrlinger,situada no nº 7 da Gartenstrasse, em Stuttgart, abria uma Exposição de arte dos vagabundos.
Nos três anos seguintes, a miséria eo desemprego cresceram ainda mais. Não existiam 70.000, mas antes uns 500.000 sem-abrigos que levavam por toda a Alemanha uma vida de errância. Quando os nazis chegaram ao poder, uma das primeiras promessas foi metê-los em ordem. Deportaram os «Sinti» e os «Roms» (ciganos), declarados «racilamente inferiores», para os campos e mataram mais de 400.000. Quanto aos operários e vagabundo «arianos» obrigaram-nos pela força a sedentarizaram-se e a trabalharem. Ao mesmo tempo, centenas de anticonformistas, opositores políticos e judeus foram perseguidos, mortos ou obrigados a exilarem-se. Ao fim e ao cabo, o Estado nazi cujo objectivo deliberado era acabar com tudo o que era anti-social e criminal, acabou por se mostrar o Estado mais anti-social e criminoso da história alemã.
No ano de 1981 houve uma tentativa de retomar o «Congresso dos Vagabundos» de 1929, mas a ideia fracassou. Entretanto, o desemprego, a mendicidade e os sem-abrigo não pararam de aumentar. Há de novo mais de 100.000 pessoas na rua e ao longo das estradas. A ideia abortada de retomar aquela iniciativa, realizada no fim da República de Weimar, não tinha nada de nostálgico. A questão era antes de tentar encontrar formas eficazes de comunicação e organização susceptíveis de superar o isolamento e o desespero. Não se tratava de pôr limites à miséria, mas sim de a equacionar a partir de razões económicas. E de dizer aos políticos para inventarem outra coisa que não seja apenas o habitual reforço da polícia.

(tradução do texto publicado na revista Marginales, nº 3-4 , Hiver 2004, editado pela Agone, num número monográfico sobre «Les dépossédés,figures durefus social»)



Ecologistas e crianças acampam na Quinta Marques Gomes para a defender



Ecologistas e crianças responderam à convocatória do Terra Vivente ( ex-Terra Viva), associação de ecologia social, e durante este fim de semana estiveram acampados na Quinta Marques Guedes na zona ribeirinha de Gaia, no Canidelo, já perto da foz do rio Douro, onde está prevista a construção de uma mega urbanização promovida pela empresa Espírito Santo Fundos Imobiliários, e que por mais incrível que pareça já recebeu o acordo da Câmara de Gaia, apesar da construção prevista vir a destruir uma mancha verde insubstituível e trazer mais cimento para as encostas do rio Douro e contrariar inclusivamente o Plano Director Municipal, que terá de ser suspenso, caso contrário a urbanização prevista seria ilegal.

Enfim, mais uma negociata entre imobiliárias e autarquias…